quarta-feira, 22 de abril de 2009
América Latina “exporta” Chagas para primeiro mundo
A doença de Chagas, descoberta pelo cientista brasileiro Carlos Chagas há cem anos no interior de Minas Gerais, além de não ter sido erradicada até hoje da América Latina – (maior região afetada até agora, com cerca de 12 milhões de pessoas infectadas) - já foi “exportada” para os Estados Unidos e Canadá. Imigrantes contaminados levaram o problema também para o Japão e alguns países da Europa.
Estados Unidos e Canadá começam a se preocupar com as diversas formas de controle e tratamento dessa doença: além de causar mau funcionamento do esôfago e intestino, provoca problemas cardíacos severos. Tanto que o cardiologista José Antônio Marin Neto, Professor Titular do departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, da USP, e Diretor da Unidade de Cardiologia Intervencionista do Hospital das Clínicas - mantém contacto constante com cientistas norte-americanos e canadenses.
O cientista, vencedor de dois prêmios Jabuti, por livros escritos em colaboração com outros autores e publicados pela Sociedade de Cardiologia de São Paulo, tem preocupação especial com esse problema de saúde que faz parte da lista das moléstias que afetam especialmente os mais pobres e são historicamente negligenciadas. As estimativas mais conservadoras de prevalência de moléstia de Chagas , segundo o especialista , são de que entre 4 a 6 milhões de brasileiros têm a doença e de que na América do Sul esse número oscila de 11 a 12 milhões de pessoas .
Imigração leva doença
Nos Estados Unidos, de acordo com levantamentos indiretos, a estimativa é que existam entre 100 a 120 mil portadores da Moléstia de Chagas, oriundos de imigração de países latino-americanos, entre os quais o Brasil, onde a doença é crônica .
- Na verdade já foram descritos não mais do que meia dúzia de casos da doença contraída dentro dos Estados Unidos. O inseto transmissor vive em áreas restritas, infectando animais selvagens, com difíceis condições de relacionamento humano, o que não facilita a transmissão.
O alarme foi dado quando se verificou que a doença estava se espalhando também pela doação de órgãos e nas transfusões de sangue - neste último caso, estimativas em 17 estados norte-americanos, mostravam uma contaminação a cada 25000 doações. Já em regiões mais densamente habitadas por imigrantes latino-americanos, como a baixa Califórnia, essas cifras eram ainda mais alarmantes: um doador infectado a cada 2000 doações de sangue.
Antes dessas informações, o exame de sangue para Chagas não era solicitado naquele país.
- Depois de duas reuniões a que fomos convidados a participar, com outro pesquisador brasileiro, Dr. Anis Rassi Jr, de Goiänia, junto ao órgão que controla a transmissão de doenças nos Estados Unidos, sediado em Atlanta – o CDC – o órgão controlador geral de saúde dos Estados Unidos, o FDA, desde dezembro de 2006, instituiu a obrigatoriedade da detecção da doença de Chagas em exames de pessoas que vão doar sangue ou órgãos. É uma determinação federal extensiva a todo o território americano.
Também resultou dessas duas reuniões uma verdadeira cartilha, publicada no Jornal da Associação Médica Americana (JAMA) em 2007, contendo normas e instruções para os médicos norte-americanos.
Investimentos
Existe expectativa de que esse problema possa atrair investimentos norte-americanos para pesquisas – dificuldade que afeta os cientistas da área.
- Há algumas iniciativas em andamento – e pode-se notar isso através das publicações e mais interesse dos órgãos de divulgação de Ciência nos Estados Unidos, observou Marin-Neto. Também cresceu o número de intercâmbios entre investigadores daquele país e pesquisadores brasileiros .
A moléstia de Chagas , por ser uma doença de paises relativamente subdesenvolvidos - América do Sul como um todo - e afetar principalmente a camada mais excluída da população - é negligenciada em todos os níveis, segundo o pesquisador.
Os únicos remédios usados para o tratamento da doença de Chagas em todo o mundo, por exemplo, (nifurtimox e benzonidazol) foram produzidos quatro décadas atrás . Os dois têm efeitos colaterais, não têm rendimento considerado adequado e um deles (nifurtimox) nem é mais fabricado no Brasil.
Novos casos na Amazônia
O número de casos agudos da doença no país foi bastante reduzido, mas não ainda de forma completa. Segundo dados da Fundação Fio Cruz, divulgados pelo Cremesp, nos últimos cinco anos surgiram de 50 a 100 novos casos da doença no país, a maioria na região Amazônica . Também existem, por exemplo, no sul da Bahia e norte de Minas , áreas que ainda não tiveram controle vetorial inteiramente efetivado.
A doença provoca quatro mil mortes por ano, matando mais do que AIDS e dengue, por exemplo.
- Há um perigo em potencial, de que a doença de Chagas, dominada em boa parte do território nacional, recrudesça novamente num território como o da Amazonas, em conseqüência do desflorestamento indiscriminado - alerta o pesquisador José Antônio Marin-Neto.
Doença foi descoberta por acaso em Lassance
Pouca gente sabe que Carlos Ribeiro Justiniano Chagas - cientista brasileiro reverenciado nos meios científicos, lembrado pela população em geral em razão da doença que leva seu nome – descobriu sozinho todo o ciclo dessa doença: o vetor ( “ barbeiro” ), o seu agente causal ( Tripanossoma batizado de cruzi, em homenagem a Oswaldo Cruz), o reservatório do parasito (em um gato) e finalmente no ser humano (na menina Berenice) - um feito sem similar na história da Medicina..
Carlos Chagas, indicado quatro vezes ao Prêmio Nobel, nasceu há 129 anos no município de Oliveira, Minas Gerais , estado onde identificou por acaso, na cidade de Lassance, entre 1908 e 1909, uma nova doença já disseminada pela zona rural de todo o país.
“Ele não só descobriu a Doença de Chagas, como foi o primeiro cientista a mostrar a importância dos mosquitos domésticos na transmissão da malária e a defender a teoria de o impaludismo ser moléstia domiciliar”, lembra o parasitologista Milton Carneiro, em seu livro “ História da Doença de Chagas” onde considera o cientista, “a figura mais fascinante entre os sábios brasileiros”.
Já o médico e escritor Pedro Nava assinala em artigo que Carlos Chagas dotou a cidade do Rio de Janeiro de três hospitais, realizou campanhas de profilaxia contra a ancilostomose, a malária, a lepra; executou trabalhos de saneamento no Amazonas e na Serra do Mar e criou a enfermagem técnica e os cursos de Saúde Pública no país.
O acaso
Carlos Chagas saiu do Rio, a pedido de Oswaldo Cruz, para controlar um surto de malária no norte de Minas. Os trabalhadores estavam construindo um trecho da estrada de Ferro da Central do Brasil em Lassance. O médico se alojou em um vagão ferroviário, transformado em laboratório e. atendia os doentes em um ambulatório improvisado no alpendre de uma casa abandonada. Um engenheiro da ferrovia chamou a atenção dele para um inseto conhecido como “chupão” ou “barbeiro”, porque se alimenta de sangue e pica o rosto das pessoas à noite.
O cientista examinou o inseto, entre outros que capturava nas horas vagas e encontrou um protozoário diferente. Ele verificou o mesmo parasito no sangue de uma criança febril, a menina Berenice. Apesar de infectada desde a infância, Berenice não desenvolveu a doença e morreu aos 63 anos de idade. Ela foi o exemplo mais conhecido do enigma que até hoje desafia os pesquisadores: por que algumas pessoas desenvolvem a doença e outras não?
Pesquisa quer desvendar enigma
Uma pesquisa internacional em andamento há quatro anos em 40 centros montados no Brasil, Argentina e Colômbia deverá ser ampliada com outras equipes na Venezuela, Bolívia e Paraguai. O estudo, segundo o professor José Antônio Marin-Neto – um dos dois coordenadores internacionais do projeto, junto com o Dr.Carlos Morillo, do Canadá, – deve continuar por mais quatro anos, com o objetivo de determinar se ao eliminar do organismo o parasito responsável pela doença - Tripanossoma cruzi – a pessoa com a forma crônica da moléstia, se beneficiará ou não desse fato.
- Essa possibilidade é fundamental e, por mais estranho que pareça, ainda não foi testada até hoje, em pessoas que já desenvolveram as complicações cardíacas. Mas o fato essencial é que a doença é infecciosa e embora outros mecanismos possam contribuir, as lesões no coração parecem depender fundamentalmente da inflamação causada pela presença do parasito.
Neste, que já é o maior estudo de todos os tempos sobre a doença de Chagas, os pacientes são tratados durante dois meses com o medicamento benzonidazol e depois acompanhados para determinar se a evolução da moléstia é influenciada ou não pela eliminação do Tripanossoma cruzi.
O estudo já arrolou até agora 1158 pacientes crônicos, conta o coordenador, otimista com a possibilidade de ainda se ter tempo para eventualmente beneficiar milhões de doentes existentes no mundo.
- O nosso intuito é acompanhar 3 mil chagásicos por cinco anos. Atualmente trabalham com protocolo único, 24 centros brasileiros envolvidos nessa doença, 12 centros na Argentina e 4 centros na Colômbia.
No Brasil, os centros pesquisadores estão no Estado de São Paulo (São José do Rio Preto, Ribeirão Preto, São Paulo – InCor, Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, e Escola Paulista de Medicina), Rio de Janeiro , Minas (Uberaba, Uberlândia, Belo Horizonte ) Goiânia, Recife , Salvador , Florianópolis e Curitiba.
Canadá e OMS financiam
Os imigrantes latino-americanos -brasileiros entre eles- também levaram a doença para o Canadá, onde segundo dados não oficiais, cerca de 100 mil pessoas podem ser portadoras da infecção. Estimativa que levou o governo daquele país, como abordagem inicial do problema, a se interessar pelo financiamento desse estudo multicêntrico, conhecido pelo acrônimo “BENEFIT”, nos meios científicos.
- Ante nossa solicitação, acederam em financiar parcialmente o projeto. Estamos tirando água de pedra - confessou Marin-Neto, ao lembrar que a outra metade do custo está sendo bancada pela Organização Mundial da Saúde, através do seu órgão de doenças negligenciadas.
A verba da OMS, também pequena, permitiu a compra do próprio remédio utilizado na pesquisa, junto à antiga organização fabricante, e que agora é produzido em um laboratório oficial do Recife.
Desafios da doença
Apesar de ter sido descoberta há 100 anos, até hoje ainda existem lacunas no entendimento da doença . Segundo o pesquisador Marin-Neto, dos que são infectados pelo Tripanossoma cruzi, cerca de 50% desenvolvem as complicações da doença de Chagas.
- A outra metade, não desenvolve complicações relacionadas com a doença, mas, infelizmente, não há meios de se distinguir quais os que vão evoluir e quais os que não vão se complicar.
Os que desenvolvem a doença, segundo o cardiologista, têm como principal problema as complicações cardíacas. Secundariamente o esôfago - o órgão que liga a cavidade bucal ao estômago, provocando o mal de engasgo - e ainda a parte final do intestino, que se dilata e deixa de funcionar.
- O coração pode começar a bater muito devagar ou muito rapidamente, ambas as situações potencialmente perigosas. Outro complicador é que o músculo se enfraquece, o coração se dilata e fica sem força para impulsionar a circulação. Quando o ritmo do coração fica lento, temos o marca-passo. Quando o coração bate muito rápido, o paciente pode entrar para o grupo dos 75% que falecem de maneira súbita por causa da arritmia .
Diferentes fases
Quando a pessoa é contaminada, ocorre infecção aguda e raramente os pacientes morrem nessa fase, muitas vezes mal diagnosticada, pois se confunde até com uma simples gripe. O paciente se recupera e a doença não dá mais sinais por décadas.
- Até que as complicações da fase crônica aparecem. Se for feito o exame de sangue, na maioria das vezes se detecta que o paciente tem a infecção. Mas ainda não conseguimos explicar porque alguns permanecem até o final da vida nesse estágio, quando a doença é conhecida como forma indeterminada . Já outros evoluem para as complicações que são fatais, em algumas circunstâncias - afirmou Marin-Neto.
Formas de transmissão
Além da transmissão da doença através da picada do inseto, a segunda causa mais importante da propagação de Chagas é por transfusão de sangue.
- No Brasil, com o advento da AIDS os bancos de sangue se equiparam de maneira eficaz para detectar, entre outras, a doença de Chagas. Mas infelizmente não temos ainda convicção de que esse problema tenha sido devida e absolutamente solucionado.
Marin-Neto lembrou que, embora escassos, tem conhecimento de casos de transmissão da doença por doação de sangue ou de órgãos - sempre de indivíduos supostamente negativos; o que se deve a uma falha , provavelmente, na identificação de quem está ou não contaminado.
- Há pouco tempo tivemos no Hospital das Clínicas de Ribeirão Preto o caso de uma paciente que recebeu um transplante de fígado e desenvolveu a doença a partir de um doador que não tinha a doença, aparentemente, mas a transmitiu. Ela desenvolveu a forma aguda, foi tratada e respondeu muito bem, superando o problema, que chegou a ser muito grave.
Via oral
- Enquanto a população não for incluída socialmente, não tiver um padrão de vida consentâneo com um país que está se desenvolvendo, continua sendo possível que se reúnam as circunstâncias que favorecem uma doença inaceitável como essa - alerta o pesquisador .
Uma outra forma de transmissão, raramente investigada, são os chamados surtos de contaminação oral, por exemplo, por suco de açaí, de garapa ou de ingestão de produtos animais infectados; por exemplo, entre maio de 2005 e agosto de 2006, foram registrados 15 surtos da doença nos Estados do Pará , Amazonas e Amapá, segundo dados do Cremesp.
Existem algumas hipóteses para esse fato raro, mas o professor Marin-Neto está certo de que a causa mais provável da contaminação foi a do inseto triturado junto com o açaí ou a cana, por causa da maneira pouca higiênica com que esses sucos foram produzidos.
- O que nos alarmou é que nesses casos, o número de indivíduos que morreram na fase aguda foi muito mais alto do que o que se observa normalmente. E isso provavelmente se deve ao fato de que o agente - o Tripanossoma cruzi - foi introduzido no organismo, em grandes quantidades, através de regiões mais vulneráveis do corpo humano, as mucosas da boca e do estômago – disse Marin- Neto.
Outra forma de transmissão é a placentária, pela mãe portadora de Chagas, ao feto.
- Em tese, é um risco baixo – porque existem mecanismos naturais protetores, mas a transmissão, nessas condições, é bastante imprevisível. Se houver suspeita, pelo fato de a mãe ser infectada, deve-se fazer o teste na criança, após os primeiros 3-6 meses, e, se positivo, instituir-se o tratamento para erradicar o parasito de ambos (mãe e filho) - orienta o especialista.
Por Rubens Zaidan, do Jornal "A Cidade" Ribeirão Preto.
sexta-feira, 3 de abril de 2009
Ordem e progresso, com ciência e tecnologia
O ano aqui é 1900, e o médico Luís Pereira Barreto (1840 - 1923), defensor histórico desse regime republicano pelo PRP - Partido Republicano Paulista - se empenha na escrita dos manuscritos do livro: “O Século XX sob o ponto de vista Brasileiro”. Obra, que desde as primeiras linhas, na concepção do autor, pretende orientar os futuros leitores a seguir ideias, que se aplicadas, farão o Brasil caminhar sobre a égide do Positivismo, e o transformarão numa grande nação.
A corrente filosófica escolhida, por dr Barreto, para nortear esse trabalho, originou-se do filósofo e matemático August Comte (1798 - 1857). O francês defendia que a tarefa da ciência é a de estudar os fatos, as regularidades da natureza e da sociedade, para, desse modo, as formular como leis. Além disso, ele acreditava que a humanidade só atingiria a plena maturidade do pensamento após o abandono da pseudo-explicações, as substituindo por uma irrestrita adesão ao método científico.
Tratava-se de um momento delicado da História, explica a pesquisadora Maria Helena Souza Patto, oportuno para se lançar um livro que pregasse mudanças a favor do desenvolvimento nacional. Pois, a instauração do novo regime ainda não conseguia motivar mudanças econômicas, sociais e políticas mais profundas.
O “Pai do Positivismo brasileiro” soube identificar muito bem esse contexto. Era um homem culto e bem informado, de família ruralista fluminense que migrou para o Estado de São Paulo e se tornou, na região de Ribeirão Preto, um das maiores de proprietários de fazendas de café. No passado, ele havia aprendido a se diferenciar da elite ruralista brasileira, ao estudar Medicina e Ciências Naturais na Bélgica. Mas, era justamente essa bagagem, repleta de conhecimentos científicos e filosóficos, que o faziam sentir um contínuo incomodo. Afinal, ele presenciava, no dia-a-dia, a situação de atraso do Brasil, apesar de tantas riquezas naturais, deparava-se com a falta de saúde e educação do povo - na sua quase totalidade analfabeto. E o pior, percebia que a ordem e o progresso pregados pelo Positivismo, demorariam a acontecer. Diante dessa situação, cada vez mais, dr Barreto se manifestava publicamente.
Uma memorável foi a famosa série de artigos de 1876, publicados no “Província de São Paulo” - atual jornal o “Estado de S. Paulo” - com o título de “Terras Roxas”. Neles, o médico enaltecia o clima, dava exemplos de como outros países se desenvolveram ao cultivar, com tecnologia adequada, suas plantações.
“Foram textos pioneiros para a agronomia nacional, que descreviam com paixão, mas também tecnicamente, as qualidades das terras - do que esse chamava, na época, Oeste de São Paulo - em oposição às fluminenses, já degradadas”, explica o historiador José Eduardo Bruno.
A repercussão foi tamanha, que imediatamente conseguiu atrair novos produtores e, assim, estimular o desenvolvimento da cultura de café em terras paulistas. A ponto, do Estado de São Paulo assumir, em poucos anos, a posição de maior exportador mundial de café.
Alguns anos mais tarde, em 1907, o médico positivista apelaria mais uma vez às ciências para tentar mudar os rumos da nação que se formava. Já idoso e desanimado com o avanço alcançado pela sociedade brasileira, ele chegara à conclusão da dificuldade de transformar o País pelo método da seleção artificial - entenda-se educação. Decidiu então, se enveredar por caminhos estranhos, e aderiu à eugenia. Ele sonhava, agora, em estender - o que considerava ser a teoria da seleção natural - da sua criação de gado Caracu para o domínio humano. Ou seja, oferecer educação aos indivíduos mais inteligentes, mais saudáveis, e não desperdiçar mais recursos, e tempo, com os menos aptos, os miscigenados. Ajudar os “vitoriosos” evoluírem e melhorarem a “raça brasileira”.
A crença de que a tríade Positivismo, ciências e educação, algum dia, trariam o enriquecimento da pátria e o progresso do País, acompanhou Luís Pereira Barreto até sua morte. Mesmo que ele tenha exagerado em determinados momentos, em nome do que acreditava, uma leitura mais atenta da sua obra demonstrará que muito do que ele disse, ainda, tem valor.
Um exemplo dessa atemporalidade, encontra-se nas perguntas que ele fez na abertura do segundo capítulo de “O Século XX sob o ponto de vista Brasileiro”: “Não seremos capazes de se valer de tantos excepcionaes (sic) recursos?; não passará deveras de uma utopia o plano de engrandecimento que o Club de Engenharia traçou para o nosso futuro?; não será a nossa sociedade em massa a única responsável pelo mallogro (sic) de tão alevantadas aspirações scientíficas (sic)?”
Mais de 100 anos depois, ainda são perguntas difíceis de se responder.
Por Paulo Verri Filho.
quarta-feira, 1 de abril de 2009
Catavento: A extensão do conhecimento em uma concepção moderna de museu
O ensino de ciências para crianças e adolescentes tem despertado cada vez mais a atenção de governantes de todo o mundo. E no Brasil não faltam motivos para o poder público se preocupar com a questão. Recentemente, os resultados dos brasileiros no Programa Internacional de Avaliação de Alunos (Pisa, na sigla em inglês) - a mais completa avaliação internacional para a educação - mostra o Brasil em 52º na categoria ensino de ciências. O Brasil também tem observado uma queda na busca pela carreira científica: na maior universidade pública do país - a USP - a procura por cursos de formação de professores, incluindo os de ciências (como matemática, química e física), declinou à metade no último vestibular.
Diante desse cenário, especialistas em educação enfatizam a necessidade de incentivar os jovens para as ciências, de preferência de maneira interativa, lúdica e divertida.
O Museu Catavento, inaugurado na última quinta-feira (26) pelo Governador de São Paulo, José Serra, é uma resposta pública para melhorar tanto o ensino de ciências, quanto o interesse dos jovens pela carreira científica. Localizado no Palácio das Indústrias, edifício histórico dos anos 1920, o espaço tem oito mil metros quadrados de atrações e 250 instalações diferentes. O objetivo é aprimorar o ensino das ciências para estudantes de diversas idades, bem como contribuir para o estímulo à curiosidade, à criatividade à resolução de problemas e ao raciocínio lógico.
A proposta é que uma visita ao museu seja tão estimulante quanto a um parque de diversões. "O catavento faz girar emoções, ideias, sentimentos, e se inspirou nos principais museus do mundo no gênero", afirmou o Governador José Serra na solenidade de inauguração do novo espaço.
O presidente do Conselho da Organização Social de administração da Catavento Cultural e Educacional, Sérgio Silva de Freitas, ressaltou que o objetivo do Catavento é mostrar aos jovens um caminho que pode ser seguido no futuro em aspectos profissionais. "O Catavento pretende melhorar o ensino de ciência, em consonância com a educação regular", destaca.
No mesmo sentido, o Secretário de Ensino Superior, Carlos Vogt, que também esteve presente à inauguração, descreveu a importância deste espaço. Para ele, um museu moderno como esse, "com características que permitem aos jovens não só ver, mas interagir com as formas de conhecimento representadas nos diferentes objetos e nas diferentes situações de conhecimento" funciona, entre outras coisas, como uma motivação simpática para que os jovens se interessem pelas questões da cultura cientifica. "Desse modo, os jovens criam uma disposição afetiva bastante positiva em relação à ciência e ao conhecimento científico", completa Vogt.
O Catavento é fruto de uma parceria entre as Secretarias de Estado de Cultura e da Educação e será administrado pela Organização Social Catavento Cultural e Educacional, sob supervisão da Secretaria da Cultura.
Meteoritos e homens virtuais
O Catavento se divide em quatro seções: universo, vida, engenho e sociedade. A seção ‘universo' permite que o visitante toque um meteorito de verdade, de seis mil anos, mostra o universo e as viagens do homem à lua, o sistema solar, o céu e a Terra. A seção ‘vida' explora a biodiversidades, bioma, aves do Brasil, evolução, homem virtual, genoma e mundo microscópio. O ‘engenho' chama atenção pela sala das ilusões, mecânica, eletromagnetismo, calor, fluido e óptica. A seção ‘sociedade', traz discussões atuais sobre o desenvolvimento do ser humano, destaca os temas de ecologia, jogos de poder, educação para resultados, arte cinética, nanotecnologia e questões ligadas a sexualidade, como por exemplo, prevenção da gravidez e DSTs.
Dezenas de fibras ópticas simulam o céu de uma noite estrelada, botão acionado na Bandeira do Brasil para descobrir qual estrela corresponde a determinado estado, caverna que reproduz as formações e sons comuns, uma brincadeira com as cores, estruturas tridimensionais do corpo humano, instalações com 700 borboletas amazônicas, canto dos pássaros, instalação ‘eletromagnetismo' que deixam, literalmente, os cabelos em pé, e muitas outras atividades neste universo.
Apoio das universidades públicas
O museu conta com um importante apoio das universidades estaduais paulistas. O Instituto de Astronomia da Universidade de São Paulo (USP), por exemplo, forneceu materiais e apoio técnico para toda a área de ‘Universo'. A fundação Faculdade de Medicina da mesma universidade participa com a didática para a explicação das maquetes da instalação "Homem Virtual", além dos filmes especializados em educação sexual projetados na mesma seção. A Escola Politécnica também da USP desenvolveu o passeio digital, uma viagem em 3D pelas paisagens do Rio de Janeiro.
O projeto contou ainda com a participação do Museu Exploratório de Ciências da Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP). O museu instalou no Catavento uma réplica da NanoAventura - uma exposição interativa sobre nanociência e nanotecnologia feita por meio de jogos eletrônicos e vídeos. A NanoAventura foi desenvolvida em 2005 com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), dentre outras instituições.
Interesse por ciência
Em uma pesquisa recente sobre percepção pública da ciência realizada pelo Ministério de Ciência e Tecnologia (MCT) em nível nacional, apenas 4% dos entrevistados declararam ter visitado um centro ou museu de ciência em 2006. Porém, quando questionados sobre o interesse em ciência e tecnologia, os entrevistados revelaram que a ciência interessa mais (41% declaram ter muito interesse) do que política (20%) e moda (28%), e quase o mesmo tanto que esportes (47%). Os resultados mostram que há interesse, mas faltam iniciativas para promoção de museus e espaços de ciências - como o Catavento.
Outra pesquisa de percepção pública da ciência mais recente conduzida por um grupo de pesquisadores da UNICAMP coordenado por Carlos Vogt mostra que as pessoas que moram no Estado de São Paulo com idade maior que 35 anos têm duas vezes mais chances de serem interessadas em ciência e tecnologia do que quem tem entre 16 e 24 anos, ou seja, idade em que se decide o futuro profissional. O trabalho da UNICAMP, que foi financiado pela FAPESP, será publicado em breve, na terceira edição dos Indicadores de Ciência Tecnologia e Inovação da FAPESP.
Serviço - Catavento
Local: Palácio das Indústrias - Parque Dom Pedro II, centro
Visitação: De terça a domingo, das 9 horas às 17 horas (bilheteria fecha às 16 horas)
Idade: a partir dos 6 anos. Preço: R$ 6 e meia-entrada para estudantes e idosos
Acesso: estação do Metrô Pedro II e terminal de ônibus no Parque Dom Pedro II
Estacionamento/preço: capacidade para 200 carros. Até 3 horas (somente para visitantes do Catavento): R$ 8.
Mais informações no site: www.cataventocultural.org.br/mapas.asp/mapas.asp
Por Erica Guimarães e Sabine Righetti.
quarta-feira, 25 de março de 2009
O Valor das idéias
Recentemente, em uma reunião com amigos, estivemos discutindo o valor das idéias, o que foi ressaltado em função daquelas idéias que não são levadas adiante, mas só permanecem na cabeça dos idealizadores.
Minha opinião era a de que sim, tem valor qualquer idéia, mesmo porque nem todos têm perfil empreendedor-argumento dos que não concordavam comigo-. Mas, confesso, eu não soube defender com propriedade qual era o valor, já que tais idéias não geram benefícios a quem quer que seja, e também porque eu me apoiei principalmente em exemplos de idéias do meu conhecimento.
Sendo assim, citei, por exemplo, uma idéia que tive há muito tempo atrás, sobre como seria útil se inventassem uma máquina de preencher cheques. Naquele tempo não havia tal máquina, e eu não usei de qualquer fonte de informação nem mesmo da literatura. Passados muitos anos, no entanto, tal máquina apareceu, e eu, orgulhosa, fiz questão de compartilhar tal notícia com quem, na época, ouviu e apreciou a “minha idéia”.
E daí, qual o valor desta idéia se, enquanto sua, você não levou adiante; o mérito é totalmente de quem a implementou, manifestou um dos discordantes.
E daí, concordei, que só quem implementa uma idéia tem, de fato, o mérito, mas que, antes de implementar há que se ter a idéia, se o idealizador tem ou não o perfil para a busca da transformação da mesma em realidade, isso é outro assunto, complementei. Além disso, cumpre citar, outras vezes, só a observação e o questionamento de um fato já revela uma idéia, que nem sempre é levada adiante e somente, e as vezes, repassadas ou encaminhadas a quem seja competente em explicar ou buscar a resposta do questionamento respectivamente.
Deste caso, por exemplo, eu citei que, ao observar um arco íris duplo, me incomodou o fato de a seqüência das cores de um e outro ser invertida, o que gerou um questionamento ou, portanto, uma idéia. Não sabendo o porque disto, enviei mensagens eletrônicas para diversos órgãos e meios de divulgação de pesquisa, inclusive, à revista FAPESP (http://www.revistapesquisa.fapesp.br/).
E indaguei sobre quem poderia dizer que não tem valor esta idéia, pois certamente alguém vai levar adiante este questionamento, que o estabelecerá como de valor, e neste caso, de valor científico, complementei. Assim somos: o escritor escreve, o pintor pinta, a costureira costura, o cientista investiga, etc...e, escrever, pintar, costurar e investir são formas, adequadas ao perfil de cada um, de transformar idéias.
Eu, por exemplo, sendo uma pesquisadora, logo que tenho uma idéia relativa à minha área de pesquisa, me empenho em buscar referências bibliográficas afins para, após análise da originalidade da mesma, e também pela consulta a parceiros de nível superior ao meu, e de acordo com meu nível de conhecimento, levar adiante a idéia, até conseguir revelar a mesma apta a ser publicada em revista científica-que é o equivalente a registrar patente no caso do empreendedor-, expliquei. Ainda que, nem sempre, sejam respeitados os direitos autorais...
Ninguém manifestou qualquer interesse no meu discurso, nem por elegância para a continuidade do mesmo, e mudamos de assunto!
E eu, ainda desolada pela interrupção do assunto, concluí “com meus botões”, ser este o papel da ciência e tecnologia no desenvolvimento nacional: acreditar que havendo idealizadores de diversas naturezas, há que se empenhar em gerar condições favoráveis para que os mesmos transformem suas idéias em realidade, em especial aquelas que possam trazer benefícios à nação.
Por Mariangela Amendola, matemática e professora na Unicamp.
Minha opinião era a de que sim, tem valor qualquer idéia, mesmo porque nem todos têm perfil empreendedor-argumento dos que não concordavam comigo-. Mas, confesso, eu não soube defender com propriedade qual era o valor, já que tais idéias não geram benefícios a quem quer que seja, e também porque eu me apoiei principalmente em exemplos de idéias do meu conhecimento.
Sendo assim, citei, por exemplo, uma idéia que tive há muito tempo atrás, sobre como seria útil se inventassem uma máquina de preencher cheques. Naquele tempo não havia tal máquina, e eu não usei de qualquer fonte de informação nem mesmo da literatura. Passados muitos anos, no entanto, tal máquina apareceu, e eu, orgulhosa, fiz questão de compartilhar tal notícia com quem, na época, ouviu e apreciou a “minha idéia”.
E daí, qual o valor desta idéia se, enquanto sua, você não levou adiante; o mérito é totalmente de quem a implementou, manifestou um dos discordantes.
E daí, concordei, que só quem implementa uma idéia tem, de fato, o mérito, mas que, antes de implementar há que se ter a idéia, se o idealizador tem ou não o perfil para a busca da transformação da mesma em realidade, isso é outro assunto, complementei. Além disso, cumpre citar, outras vezes, só a observação e o questionamento de um fato já revela uma idéia, que nem sempre é levada adiante e somente, e as vezes, repassadas ou encaminhadas a quem seja competente em explicar ou buscar a resposta do questionamento respectivamente.
Deste caso, por exemplo, eu citei que, ao observar um arco íris duplo, me incomodou o fato de a seqüência das cores de um e outro ser invertida, o que gerou um questionamento ou, portanto, uma idéia. Não sabendo o porque disto, enviei mensagens eletrônicas para diversos órgãos e meios de divulgação de pesquisa, inclusive, à revista FAPESP (http://www.revistapesquisa.fapesp.br/).
E indaguei sobre quem poderia dizer que não tem valor esta idéia, pois certamente alguém vai levar adiante este questionamento, que o estabelecerá como de valor, e neste caso, de valor científico, complementei. Assim somos: o escritor escreve, o pintor pinta, a costureira costura, o cientista investiga, etc...e, escrever, pintar, costurar e investir são formas, adequadas ao perfil de cada um, de transformar idéias.
Eu, por exemplo, sendo uma pesquisadora, logo que tenho uma idéia relativa à minha área de pesquisa, me empenho em buscar referências bibliográficas afins para, após análise da originalidade da mesma, e também pela consulta a parceiros de nível superior ao meu, e de acordo com meu nível de conhecimento, levar adiante a idéia, até conseguir revelar a mesma apta a ser publicada em revista científica-que é o equivalente a registrar patente no caso do empreendedor-, expliquei. Ainda que, nem sempre, sejam respeitados os direitos autorais...
Ninguém manifestou qualquer interesse no meu discurso, nem por elegância para a continuidade do mesmo, e mudamos de assunto!
E eu, ainda desolada pela interrupção do assunto, concluí “com meus botões”, ser este o papel da ciência e tecnologia no desenvolvimento nacional: acreditar que havendo idealizadores de diversas naturezas, há que se empenhar em gerar condições favoráveis para que os mesmos transformem suas idéias em realidade, em especial aquelas que possam trazer benefícios à nação.
Por Mariangela Amendola, matemática e professora na Unicamp.
O encontro de dois amigos brasileiros
Faziam mais de cinco anos que os dois não se encontravam. Amigos de infância, a dupla escolhera caminhos diferentes para suas vidas: um acabara de retornar do Estados Unidos, onde concluiu sua pós graduação; o outro havia se formado em uma universidade pública de São Paulo e era especialista em plantas medicinais da Amazônia. Atualmente participava de um projeto em parceria com pesquisadores da Europa.
Vamos lá, conte-me o que têm feito? - perguntou o biólogo questionador.
Acabei de retornar dos EUA, onde fiz minha pós graduação. E não vejo a hora de pode voltar para lá de novo. Aquilo sim é que país: uma potência mundial, muita riqueza, emprego, desenvolvimento. - respondeu o engenheiro – E você, como anda?
Eu me formei ano passado em Biologia e estou trabalhando em parceria com pesquisadores ingleses. Em virtude das dificuldades em conseguir financiamento para minhas pesquisas no Brasil, resolvi procurar recursos estrangeiros. - Lá sim eles investem em ciência. É onde se produz conhecimento - explicou.
E é por isso que são países desenvolvidos. Nos EUA também é assim – comentou o amigo, quase americanizado. Ele retirou uma caneta do bolso, com a qual rabiscou no guardanapo – eles pensam no ciclo em que, se você investe em pesquisa, você produz conhecimento, que produz tecnologia, que melhora a qualidade de vida das pessoas.
O brasileiro, no entanto, não compreendeu qual a relação de ciência e tecnologia com a qualidade de vida das pessoas.
Como assim? O que uma coisa tem haver com a outra? - questionou.
Nesses países as políticas públicas estão diretamente relacionados aos setores do conhecimento, auxiliando nas tomadas de decisão em benefício da maioria da população - explicou o gringo brasileiro.
O amigo tupiniquim, empolgado com a conversa, perguntou:
Então é verdade que o país que investe muito em pesquisa e tecnologia é mais desenvolvido?
Com certeza. Basta ver os EUA: país desenvolvido e que tem a maior produção de artigos científicos do mundo. É uma relação direta - revelou o recém chegado dos EUA, citando a frase de Oswaldo Cruz: “Meditai se só as nações fortes podem fazer ciência, ou se é a ciência que as faz fortes”.
O especialista em plantas, no entanto, tinha uma grande dificuldade em aceitar o esquema das publicações. No passado havia sofrido fortes pressões para que publicasse vários artigos, mesmo não tendo resultados importantes.
Nem me fale nessa história de quantidade de publicações. O que importa hoje em dia é publicar, publicar. Quanto mais melhor. Não é quanto melhor, melhor.
Fazer o quê? Infelizmente essa é a lei imposta. O mais importante é cada um fazer sua parte - ponderou o amigo.
Sem contar nas pesquisas financiadas por instituições privadas, que exigem resultados práticos, rápidos e não dividem nem um pouco do lucro que conseguem com nossos resultados –comentou bravamente - Veja a empresa que eu trabalho: estamos descobrindo uma substância de uma planta amazônica que poderá curar diversas doenças. E os donos já estão buscando meios de driblar as leis e privar todos dos benefícios, fazendo com que até mesmo os brasileiros paguem pelo remédio - desabafou o brasileirinho.
Seria tão bom se o Brasil investisse em pesquisas que beneficiassem a sociedade!!! - sonhou alto o engenheiro – eu até retornaria para cá.
Mas o Brasil está melhorando nesse aspecto né? - disse, referindo-se à conquista do 15 lugar no ranking mundial de produção científica e aos investimentos previstos na recém-criada Política Nacional de ciência, tecnologia e inovação.
Logo logo seremos desenvolvidos!!! - exclamou ironicamente o “estrangeiro”.
Será? Acho que o que é desenvolvimento para um, pode não ser para outro. O Brasil tem sua própria história, não dá pra comparar com outros países. Têm suas demandas. Não pode ficar se espelhando nos chamados países desenvolvidos - comentou o saudosista brasileiro.
Isso é verdade, concordou o amigo. Basta ver o que eles fizeram com suas florestas, seus recursos naturais. Acabaram com tudo – referindo-se aos países do primeiro mundo.
Pois é, e hoje enviam dinheiro para os países do terceiro mundo preservar o que ainda resta, enquanto poluem à vontade – indignou-se o botânico.
Por isso eu acho: não há porque ficar chateado pois não somos desenvolvidos – comentou - Esse é o destino do Brasil – conformou-se o gringo brasileiro.
Eu discordo, acho que devemos ficar orgulhosos de não sermos igual à esses países.
Deveríamos construir uma nova concepção de desenvolvimento – retrucou rapidamente o amigo.
E você acha isso fácil? - perguntou o pós graduado, formado nos EUA.
Fácil não é. Mas talvez esse seja o papel da ciência e da tecnologia brasileira: descobrir alternativas ao desenvolvimento que existe nos países do primeiro mundo. Não copiá-lo.
Pois esse desenvolvimento é o mesmo que extermina suas bases de sustentação – afirmou o amigo patriota.
Hã? Não entendi.
Pois é. Você não disse que os EUA são desenvolvidos pois tem muita riqueza? E de onde vem essa riqueza? Pra ter riqueza eles exploram alguém e/ou alguma coisa. E isso nunca tem fim.
É, acho que agora entendi o que você quis dizer.
Eu quis dizer que o desenvolvimento buscado e alcançado pela ciência e tecnologia deve ser baseado no respeito ao meio ambiente, à biodiversidade, à vida e às culturas locais. Pois só assim teremos um Brasil livre e dono do seu destino.
Chega de papo furado, já sonhamos demais. Vamos pagar a conta? - sugeriu o brasileiro americanizado, encerando a conversa pois já estava com dor de cabeça de tanto pensar no assunto.
Por Felipe Augusto Zanusso Souza.
Vamos lá, conte-me o que têm feito? - perguntou o biólogo questionador.
Acabei de retornar dos EUA, onde fiz minha pós graduação. E não vejo a hora de pode voltar para lá de novo. Aquilo sim é que país: uma potência mundial, muita riqueza, emprego, desenvolvimento. - respondeu o engenheiro – E você, como anda?
Eu me formei ano passado em Biologia e estou trabalhando em parceria com pesquisadores ingleses. Em virtude das dificuldades em conseguir financiamento para minhas pesquisas no Brasil, resolvi procurar recursos estrangeiros. - Lá sim eles investem em ciência. É onde se produz conhecimento - explicou.
E é por isso que são países desenvolvidos. Nos EUA também é assim – comentou o amigo, quase americanizado. Ele retirou uma caneta do bolso, com a qual rabiscou no guardanapo – eles pensam no ciclo em que, se você investe em pesquisa, você produz conhecimento, que produz tecnologia, que melhora a qualidade de vida das pessoas.
O brasileiro, no entanto, não compreendeu qual a relação de ciência e tecnologia com a qualidade de vida das pessoas.
Como assim? O que uma coisa tem haver com a outra? - questionou.
Nesses países as políticas públicas estão diretamente relacionados aos setores do conhecimento, auxiliando nas tomadas de decisão em benefício da maioria da população - explicou o gringo brasileiro.
O amigo tupiniquim, empolgado com a conversa, perguntou:
Então é verdade que o país que investe muito em pesquisa e tecnologia é mais desenvolvido?
Com certeza. Basta ver os EUA: país desenvolvido e que tem a maior produção de artigos científicos do mundo. É uma relação direta - revelou o recém chegado dos EUA, citando a frase de Oswaldo Cruz: “Meditai se só as nações fortes podem fazer ciência, ou se é a ciência que as faz fortes”.
O especialista em plantas, no entanto, tinha uma grande dificuldade em aceitar o esquema das publicações. No passado havia sofrido fortes pressões para que publicasse vários artigos, mesmo não tendo resultados importantes.
Nem me fale nessa história de quantidade de publicações. O que importa hoje em dia é publicar, publicar. Quanto mais melhor. Não é quanto melhor, melhor.
Fazer o quê? Infelizmente essa é a lei imposta. O mais importante é cada um fazer sua parte - ponderou o amigo.
Sem contar nas pesquisas financiadas por instituições privadas, que exigem resultados práticos, rápidos e não dividem nem um pouco do lucro que conseguem com nossos resultados –comentou bravamente - Veja a empresa que eu trabalho: estamos descobrindo uma substância de uma planta amazônica que poderá curar diversas doenças. E os donos já estão buscando meios de driblar as leis e privar todos dos benefícios, fazendo com que até mesmo os brasileiros paguem pelo remédio - desabafou o brasileirinho.
Seria tão bom se o Brasil investisse em pesquisas que beneficiassem a sociedade!!! - sonhou alto o engenheiro – eu até retornaria para cá.
Mas o Brasil está melhorando nesse aspecto né? - disse, referindo-se à conquista do 15 lugar no ranking mundial de produção científica e aos investimentos previstos na recém-criada Política Nacional de ciência, tecnologia e inovação.
Logo logo seremos desenvolvidos!!! - exclamou ironicamente o “estrangeiro”.
Será? Acho que o que é desenvolvimento para um, pode não ser para outro. O Brasil tem sua própria história, não dá pra comparar com outros países. Têm suas demandas. Não pode ficar se espelhando nos chamados países desenvolvidos - comentou o saudosista brasileiro.
Isso é verdade, concordou o amigo. Basta ver o que eles fizeram com suas florestas, seus recursos naturais. Acabaram com tudo – referindo-se aos países do primeiro mundo.
Pois é, e hoje enviam dinheiro para os países do terceiro mundo preservar o que ainda resta, enquanto poluem à vontade – indignou-se o botânico.
Por isso eu acho: não há porque ficar chateado pois não somos desenvolvidos – comentou - Esse é o destino do Brasil – conformou-se o gringo brasileiro.
Eu discordo, acho que devemos ficar orgulhosos de não sermos igual à esses países.
Deveríamos construir uma nova concepção de desenvolvimento – retrucou rapidamente o amigo.
E você acha isso fácil? - perguntou o pós graduado, formado nos EUA.
Fácil não é. Mas talvez esse seja o papel da ciência e da tecnologia brasileira: descobrir alternativas ao desenvolvimento que existe nos países do primeiro mundo. Não copiá-lo.
Pois esse desenvolvimento é o mesmo que extermina suas bases de sustentação – afirmou o amigo patriota.
Hã? Não entendi.
Pois é. Você não disse que os EUA são desenvolvidos pois tem muita riqueza? E de onde vem essa riqueza? Pra ter riqueza eles exploram alguém e/ou alguma coisa. E isso nunca tem fim.
É, acho que agora entendi o que você quis dizer.
Eu quis dizer que o desenvolvimento buscado e alcançado pela ciência e tecnologia deve ser baseado no respeito ao meio ambiente, à biodiversidade, à vida e às culturas locais. Pois só assim teremos um Brasil livre e dono do seu destino.
Chega de papo furado, já sonhamos demais. Vamos pagar a conta? - sugeriu o brasileiro americanizado, encerando a conversa pois já estava com dor de cabeça de tanto pensar no assunto.
Por Felipe Augusto Zanusso Souza.
terça-feira, 24 de março de 2009
Investimento em Ciência também traz Felicidade
Por mais de três séculos o Brasil amargou o triste papel de colônia importadora de tudo o que houvesse de pronto, de sapatos a maquinário pesado, fornecendo ao reino de Portugal tudo que fosse bem primário, sem que houvesse o mínimo do mínimo de tecnologia empregado no processo de manufatura. Curiosamente, o ouro era processado aqui e enviado na forma de lingotes, assim como vários tipos de minérios, como o ferro, muitas vezes processado na antiga fábrica de armas de Sorocaba. Vergonhosamente, também não havia também universidades no país, muito embora na América espanhola já houvessem várias, e, por conta disso, exportamos também nossas melhores cabeças para Portugal e outros países, ficando nossa, vá lá, elite intelectual, bastante desfalcada. Porém, findado o período colonial, não houve progresso no sentido de incrementarmos nossa indústria não indo além da exportação da matéria bruta. Continuamos na mesma na pós-alforria de Portugal.
Com a proclamação da república, já quase entrando no século XX, ficou tudo na mesma. A cana-de-açúcar, o café, o ciclo da borracha todos, em maior ou menor grau, contribuíram para que tudo permanecesse como sempre: exportando o básico e mandando lavar roupa em Lisboa. O mundo nos mandava tudo. Delivery!
Ao longo do século XX, apesar de não sermos mais colônia de ninguém e já sermos uma república, ainda que na forma de Estados Unidos, continuamos como meros exportadores de matéria-prima, exportada sem nenhum tipo de processamento, quase tão bruta como quando foi obtida na natureza. Apenas na década de 30, depois da quebra da bolsa, e do mundo, é que surge a primeira Universidade, tal qual aquele conceito de Bologna de uns 700 anos antes.
Por pressão dos Estados Unidos, não entramos na Segunda Guerra pelo lado alemão. Em troca de abdicarmos do fascismo, ganhamos uma siderúrgica. Este fato, ainda que isolado por se tratar de uma única fábrica é notável para o nosso incipiente parque tecnológico. A partir dele, aliado ao nacio-populismo da década de 50, começa no país uma revolução industrial. Indústrias chegam cada vez em maior número, necessitando de mão-de-obra cada vez mais especializada. O mero apertador de parafuso não serve mais, pois é necessário que ele produza o parafuso, além de apertar é claro. O ensino deve ser universalizado. Do básico ao superior. Na década seguinte, apesar da ditadura ou por causa dela, criam-se dezenas de universidades federais pelo país afora. Estaduais também. Tem início o ciclo tecnológico no país. Paralelamente, o Brasil ufânico, a potência do futuro, aflora como propaganda da ditadura. Investimentos maciços em produção energética são feitos; hidrelétricas são construídas, pontes são feitas, estradas, portos, aeroportos, tudo que significasse grandiosidade era incentivado e financiado. Dinheiro não era problema, pois emprestar mundo afora era moda. É o Brasil do futuro tentando nascer.
Porém, tudo o que é bom dura pouco. Assim, na primeira crise do petróleo, o Brasil se viu numa situação crítica e, de modo a deixar todos os críticos pasmos, tomou uma atitude nunca antes vista nesse país: antecipou-se às futuras crises! Criou um programa único no mundo de substituição de matriz energética, tentando encontrar um substituto viável ao petróleo. Trocar o petróleo por álcool, vindo da cana-de-açúcar tão conhecida de todos, parecia loucura na época, mas era uma possível solução e tão logo foi possível criou-se o Pro-álcool. Programa único, que necessitou de milhões de dólares de investimento e décadas de esforço humano para que se torne viável. Pela primeira vez investia-se numa cadeia completa de produção indo da matéria básica, colhida no campo, até o produto final, na bomba de combustível.
Porém, fazer álcool se transformar em combustível não era e nem é tarefa das mais complexas, mas por outro lado, produzir tecnologia, isto é, um carro com motor que pudesse rodar com esse combustível era outra coisa. Muito mais difícil. Nesse ponto entram em operação as Universidades instaladas no país nas décadas anteriores, os institutos de pesquisa e tecnologia. Sem eles não teria sido possível essa transformação tecnológica, que ainda ocorre nos dias de hoje já que melhores desempenhos são cada vez mais exigidos, impondo constantes melhorias nos projetos em andamento.
Fica claro, nesse exemplo banal, que a tecnologia depende de investimentos diretos em formação de pessoal e equipamentos, que pode parecer dispendioso, porque a primeira vista não trás resultado algum, mas que uma geração depois pode fazer diferença para toda uma linha de produção e para todo um país, trazendo investimentos estrangeiros e tornando-nos exportadores de tecnologia, cujo valor financeiro final é imensamente maior que a exportação de bananas.
Tecnologia e desenvolvimento social andam de mãos dadas, sempre que há interesse é óbvio. Interesse da sociedade civil e governamental.
Produzir ciência não implica em produzir tecnologia e muitas vezes é necessário esperar décadas entre a teoria do objeto e o objeto em si. Porém, ciência produz cientistas, óbvio ululante, que podem ajudar na democratização de idéias, na popularização de temas. Ou seja, a ciência pode ajudar a produzir uma sociedade mais consciente daquilo que ela necessita. A tecnologia é conseqüência daquilo que se quer enquanto sociedade. Desta forma, a ciência ajuda a educar a sociedade que ajuda a escolher que tecnologias quer utilizar para enfrentar o mundo, isto é, as outras sociedades organizadas segundo o seu modo de vida. Nos dias de hoje quanto mais limpa for a tecnologia melhor para todos. Cientistas ou não.
No Brasil, apesar de todo o atraso visto acima, estamos assumindo uma liderança expressiva na matriz bioenergética. Reciclamos alguns materiais em índices acima de paises considerados desenvolvidos. Evidentemente, temos um caminho muito longo ainda para percorrer em busca de melhorarias sociais, mas este caminho poderá ser suavizado ou, quem sabe, encurtado, caso investimento sejam feitos em ciência básica, prevenção de doenças, saneamento básico e educação. Depois desses passos básicos talvez, quem sabe, possamos voar.
Por Sérgio Campos, matemático e físico.
Com a proclamação da república, já quase entrando no século XX, ficou tudo na mesma. A cana-de-açúcar, o café, o ciclo da borracha todos, em maior ou menor grau, contribuíram para que tudo permanecesse como sempre: exportando o básico e mandando lavar roupa em Lisboa. O mundo nos mandava tudo. Delivery!
Ao longo do século XX, apesar de não sermos mais colônia de ninguém e já sermos uma república, ainda que na forma de Estados Unidos, continuamos como meros exportadores de matéria-prima, exportada sem nenhum tipo de processamento, quase tão bruta como quando foi obtida na natureza. Apenas na década de 30, depois da quebra da bolsa, e do mundo, é que surge a primeira Universidade, tal qual aquele conceito de Bologna de uns 700 anos antes.
Por pressão dos Estados Unidos, não entramos na Segunda Guerra pelo lado alemão. Em troca de abdicarmos do fascismo, ganhamos uma siderúrgica. Este fato, ainda que isolado por se tratar de uma única fábrica é notável para o nosso incipiente parque tecnológico. A partir dele, aliado ao nacio-populismo da década de 50, começa no país uma revolução industrial. Indústrias chegam cada vez em maior número, necessitando de mão-de-obra cada vez mais especializada. O mero apertador de parafuso não serve mais, pois é necessário que ele produza o parafuso, além de apertar é claro. O ensino deve ser universalizado. Do básico ao superior. Na década seguinte, apesar da ditadura ou por causa dela, criam-se dezenas de universidades federais pelo país afora. Estaduais também. Tem início o ciclo tecnológico no país. Paralelamente, o Brasil ufânico, a potência do futuro, aflora como propaganda da ditadura. Investimentos maciços em produção energética são feitos; hidrelétricas são construídas, pontes são feitas, estradas, portos, aeroportos, tudo que significasse grandiosidade era incentivado e financiado. Dinheiro não era problema, pois emprestar mundo afora era moda. É o Brasil do futuro tentando nascer.
Porém, tudo o que é bom dura pouco. Assim, na primeira crise do petróleo, o Brasil se viu numa situação crítica e, de modo a deixar todos os críticos pasmos, tomou uma atitude nunca antes vista nesse país: antecipou-se às futuras crises! Criou um programa único no mundo de substituição de matriz energética, tentando encontrar um substituto viável ao petróleo. Trocar o petróleo por álcool, vindo da cana-de-açúcar tão conhecida de todos, parecia loucura na época, mas era uma possível solução e tão logo foi possível criou-se o Pro-álcool. Programa único, que necessitou de milhões de dólares de investimento e décadas de esforço humano para que se torne viável. Pela primeira vez investia-se numa cadeia completa de produção indo da matéria básica, colhida no campo, até o produto final, na bomba de combustível.
Porém, fazer álcool se transformar em combustível não era e nem é tarefa das mais complexas, mas por outro lado, produzir tecnologia, isto é, um carro com motor que pudesse rodar com esse combustível era outra coisa. Muito mais difícil. Nesse ponto entram em operação as Universidades instaladas no país nas décadas anteriores, os institutos de pesquisa e tecnologia. Sem eles não teria sido possível essa transformação tecnológica, que ainda ocorre nos dias de hoje já que melhores desempenhos são cada vez mais exigidos, impondo constantes melhorias nos projetos em andamento.
Fica claro, nesse exemplo banal, que a tecnologia depende de investimentos diretos em formação de pessoal e equipamentos, que pode parecer dispendioso, porque a primeira vista não trás resultado algum, mas que uma geração depois pode fazer diferença para toda uma linha de produção e para todo um país, trazendo investimentos estrangeiros e tornando-nos exportadores de tecnologia, cujo valor financeiro final é imensamente maior que a exportação de bananas.
Tecnologia e desenvolvimento social andam de mãos dadas, sempre que há interesse é óbvio. Interesse da sociedade civil e governamental.
Produzir ciência não implica em produzir tecnologia e muitas vezes é necessário esperar décadas entre a teoria do objeto e o objeto em si. Porém, ciência produz cientistas, óbvio ululante, que podem ajudar na democratização de idéias, na popularização de temas. Ou seja, a ciência pode ajudar a produzir uma sociedade mais consciente daquilo que ela necessita. A tecnologia é conseqüência daquilo que se quer enquanto sociedade. Desta forma, a ciência ajuda a educar a sociedade que ajuda a escolher que tecnologias quer utilizar para enfrentar o mundo, isto é, as outras sociedades organizadas segundo o seu modo de vida. Nos dias de hoje quanto mais limpa for a tecnologia melhor para todos. Cientistas ou não.
No Brasil, apesar de todo o atraso visto acima, estamos assumindo uma liderança expressiva na matriz bioenergética. Reciclamos alguns materiais em índices acima de paises considerados desenvolvidos. Evidentemente, temos um caminho muito longo ainda para percorrer em busca de melhorarias sociais, mas este caminho poderá ser suavizado ou, quem sabe, encurtado, caso investimento sejam feitos em ciência básica, prevenção de doenças, saneamento básico e educação. Depois desses passos básicos talvez, quem sabe, possamos voar.
Por Sérgio Campos, matemático e físico.
Para se entender no mundo
O papel da alfabetização em ciência e tecnologia ultrapassou em muito a finalidade de produzir conhecimento de forma racional e metodológica e, também, de estimular o desenvolvimento econômico das nações. No último século tornou-se um instrumento de inserção cultural, econômica e de pertencimento ao mundo.
Nas últimas décadas a percepção a respeito da importância de se ensinar e aprender Ciências tem se alterado profundamente. Essa mudança reflete uma aproximação das Ciências do dia-a-dia das pessoas. Essa aproximação se dá mais no âmbito dos efeitos dos produtos da ciência e tecnologia em nossas vidas do que, propriamente, no fazer Ciência.
Em uma perspectiva mais ampla, podemos perceber que a preocupação em aproximar ciência, tecnologia e sociedade não se restringe à escola e ao currículo formal das disciplinas da área de ciências da natureza. Esta tendência apresenta-se nas diversas ações de divulgação nos museus, nos centros de ciência e tecnologia, em programas de televisão, revistas, internet e jornais voltados ao grande público.
A importância da ciência e tecnologia na sociedade atual produziu um importante movimento denominado “ciência, tecnologia e sociedade” que tem influenciado, por exemplo, no âmbito educacional, as reestruturações curriculares no estado de São Paulo e no país. Essa tendência leva em consideração o impacto atual da ciência na tecnologia, desta na indústria, na saúde, na natureza e, de modo geral, na qualidade de vida, envolvendo uma visão interdisciplinar que desconsidera a compartimentalização do conhecimento entre áreas distintas.
Tanto destaque à ciência e tecnologia nos faz questionar: qual a importância de ensinar e aprender ciências para a formação básica dos brasileiros?
Uma parte da resposta é conhecida desde a década de 1950, com os trabalhos de Robert Solow. Segundo esse economista, o desenvolvimento econômico e sustentado de um país depende de diversos fatores, entretanto, o progresso tecnológico promovido pela educação contribui mais para o crescimento econômico do que o aumento dos capitais ou da força de trabalho.
Mas, a busca de um desenvolvimento econômico e sustentado não é a única razão para se promover a alfabetização científica dos brasileiros.
Podemos compreender que esse tipo de alfabetização integrado à educação básica deve servir, também, à formação de pessoas que possam participar e usufruir das oportunidades, das responsabilidades e dos desafios inerentes a uma sociedade na qual a influência da ciência e tecnologia se faz cada vez mais presente.
É preciso, portanto, que os cidadãos sejam capazes de, com base em informações e análises bem fundamentadas, participar das decisões que afetem suas vidas, organizando um conjunto de valores mediado na consciência da importância de seu próprio aperfeiçoamento e no das relações sociais e socioambientais.
A formação de cidadãos com este perfil pressupõe o desenvolvimento de algumas competências, entre as quais cito três, para que possa dar seguimento a esta análise. São elas: construir representações simbólicas sobre fenômenos da natureza; analisar e se posicionar em relação a fatos científicos e tecnológicos e expressar-se e comunicar-se utilizando diferentes linguagens para expor seus julgamentos de valor.
Exige-se assim, que as pessoas tenham capacidade analítica e investigativa para chegar a uma decisão a respeito de situações que envolvam a natureza, a sociedade, a ciência e a tecnologia, tenham capacidade de comunicação para ouvir, interpretar e expressar diferentes pontos de vista e utilizem sua imaginação para colocar-se no lugar do outro, compreendendo concepções, argumentos e pontos de vista diferentes dos seus com sensibilidade e sem preconceitos.
Tais capacidades não são inerentes às pessoas, porém podem ser desenvolvidas pela educação e, em particular, pelo ensino de ciências. Isso porque, a ciência pode ser caracterizada como uma forma própria de pensamento e construção de conhecimento com profundas implicações no desenvolvimento sociocognitivo das pessoas.
Favorecer a alfabetização em ciências tem por funções principais a formação de pessoas capazes de, não apenas identificar o vocabulário da ciência, mas principalmente compreender conceitos e utilizá-los para enfrentar desafios e refletir seu cotidiano.
Tomemos como exemplo uma das principais características da linguagem científica, a precisão, ou seja, a capacidade de transmitir informações e conceitos relevantes de forma objetiva, com um mínimo de recursos ou texto. Essa é uma capacidade que se desenvolve ao longo de anos de formação e, cuja importância, não se restringe aos profissionais da área de ciências. Portanto, deve ser desenvolvida desde muito cedo e ao longo de toda a formação básica.
Outro pressuposto importante relacionado ao ensino de ciência é fazer com que as pessoas desenvolvam a competência de fazer pesquisa que, neste contexto, podemos considerar: aprender de forma independente e autônoma um tema ou um procedimento que não se conhece. Com o desenvolvimento desta competência espera-se que o indivíduo consiga organizar seus conhecimentos e seu trabalho de forma que a observação seja criticamente constante e que ele possa recuperar informações obtidas anteriormente. É necessário revisitar, constantemente, seus conhecimentos e concepções. É preciso ser capaz de tirar conclusões do seu trabalho, saber argumentar em favor delas e acolher os argumentos contrários. É preciso compreender a importância do erro, na tentativa de superar seus limites e reavaliar suas concepções.
Dessa forma, tanto a capacidade investigativa quanto a de comunicar-se de forma eficaz são competências que podemos compreender como modalidades estruturais da inteligência, ou melhor, ações e operações que utilizamos para estabelecer relações com e entre objetos, situações, fenômenos e pessoas que desejamos conhecer.
Podemos então deduzir que o desenvolvimento de habilidades e competências, aparentemente, do domínio da ciência pode produzir profundos efeitos na formação de qualquer pessoa. Como resultado, espera-se que esse processo de alfabetização conduza a uma mudança que envolva a vida e a responsabilidade pessoal do sujeito frente à construção de seu conhecimento.
A importância de ensinar e aprender ciências reside na possibilidade de criar oportunidades para que as pessoas construam seus saberes e na esperança de que estes saberes, construídos continuamente, lapidem a relação entre o sujeito e seu mundo.
Por Paulo Cunha.
Nas últimas décadas a percepção a respeito da importância de se ensinar e aprender Ciências tem se alterado profundamente. Essa mudança reflete uma aproximação das Ciências do dia-a-dia das pessoas. Essa aproximação se dá mais no âmbito dos efeitos dos produtos da ciência e tecnologia em nossas vidas do que, propriamente, no fazer Ciência.
Em uma perspectiva mais ampla, podemos perceber que a preocupação em aproximar ciência, tecnologia e sociedade não se restringe à escola e ao currículo formal das disciplinas da área de ciências da natureza. Esta tendência apresenta-se nas diversas ações de divulgação nos museus, nos centros de ciência e tecnologia, em programas de televisão, revistas, internet e jornais voltados ao grande público.
A importância da ciência e tecnologia na sociedade atual produziu um importante movimento denominado “ciência, tecnologia e sociedade” que tem influenciado, por exemplo, no âmbito educacional, as reestruturações curriculares no estado de São Paulo e no país. Essa tendência leva em consideração o impacto atual da ciência na tecnologia, desta na indústria, na saúde, na natureza e, de modo geral, na qualidade de vida, envolvendo uma visão interdisciplinar que desconsidera a compartimentalização do conhecimento entre áreas distintas.
Tanto destaque à ciência e tecnologia nos faz questionar: qual a importância de ensinar e aprender ciências para a formação básica dos brasileiros?
Uma parte da resposta é conhecida desde a década de 1950, com os trabalhos de Robert Solow. Segundo esse economista, o desenvolvimento econômico e sustentado de um país depende de diversos fatores, entretanto, o progresso tecnológico promovido pela educação contribui mais para o crescimento econômico do que o aumento dos capitais ou da força de trabalho.
Mas, a busca de um desenvolvimento econômico e sustentado não é a única razão para se promover a alfabetização científica dos brasileiros.
Podemos compreender que esse tipo de alfabetização integrado à educação básica deve servir, também, à formação de pessoas que possam participar e usufruir das oportunidades, das responsabilidades e dos desafios inerentes a uma sociedade na qual a influência da ciência e tecnologia se faz cada vez mais presente.
É preciso, portanto, que os cidadãos sejam capazes de, com base em informações e análises bem fundamentadas, participar das decisões que afetem suas vidas, organizando um conjunto de valores mediado na consciência da importância de seu próprio aperfeiçoamento e no das relações sociais e socioambientais.
A formação de cidadãos com este perfil pressupõe o desenvolvimento de algumas competências, entre as quais cito três, para que possa dar seguimento a esta análise. São elas: construir representações simbólicas sobre fenômenos da natureza; analisar e se posicionar em relação a fatos científicos e tecnológicos e expressar-se e comunicar-se utilizando diferentes linguagens para expor seus julgamentos de valor.
Exige-se assim, que as pessoas tenham capacidade analítica e investigativa para chegar a uma decisão a respeito de situações que envolvam a natureza, a sociedade, a ciência e a tecnologia, tenham capacidade de comunicação para ouvir, interpretar e expressar diferentes pontos de vista e utilizem sua imaginação para colocar-se no lugar do outro, compreendendo concepções, argumentos e pontos de vista diferentes dos seus com sensibilidade e sem preconceitos.
Tais capacidades não são inerentes às pessoas, porém podem ser desenvolvidas pela educação e, em particular, pelo ensino de ciências. Isso porque, a ciência pode ser caracterizada como uma forma própria de pensamento e construção de conhecimento com profundas implicações no desenvolvimento sociocognitivo das pessoas.
Favorecer a alfabetização em ciências tem por funções principais a formação de pessoas capazes de, não apenas identificar o vocabulário da ciência, mas principalmente compreender conceitos e utilizá-los para enfrentar desafios e refletir seu cotidiano.
Tomemos como exemplo uma das principais características da linguagem científica, a precisão, ou seja, a capacidade de transmitir informações e conceitos relevantes de forma objetiva, com um mínimo de recursos ou texto. Essa é uma capacidade que se desenvolve ao longo de anos de formação e, cuja importância, não se restringe aos profissionais da área de ciências. Portanto, deve ser desenvolvida desde muito cedo e ao longo de toda a formação básica.
Outro pressuposto importante relacionado ao ensino de ciência é fazer com que as pessoas desenvolvam a competência de fazer pesquisa que, neste contexto, podemos considerar: aprender de forma independente e autônoma um tema ou um procedimento que não se conhece. Com o desenvolvimento desta competência espera-se que o indivíduo consiga organizar seus conhecimentos e seu trabalho de forma que a observação seja criticamente constante e que ele possa recuperar informações obtidas anteriormente. É necessário revisitar, constantemente, seus conhecimentos e concepções. É preciso ser capaz de tirar conclusões do seu trabalho, saber argumentar em favor delas e acolher os argumentos contrários. É preciso compreender a importância do erro, na tentativa de superar seus limites e reavaliar suas concepções.
Dessa forma, tanto a capacidade investigativa quanto a de comunicar-se de forma eficaz são competências que podemos compreender como modalidades estruturais da inteligência, ou melhor, ações e operações que utilizamos para estabelecer relações com e entre objetos, situações, fenômenos e pessoas que desejamos conhecer.
Podemos então deduzir que o desenvolvimento de habilidades e competências, aparentemente, do domínio da ciência pode produzir profundos efeitos na formação de qualquer pessoa. Como resultado, espera-se que esse processo de alfabetização conduza a uma mudança que envolva a vida e a responsabilidade pessoal do sujeito frente à construção de seu conhecimento.
A importância de ensinar e aprender ciências reside na possibilidade de criar oportunidades para que as pessoas construam seus saberes e na esperança de que estes saberes, construídos continuamente, lapidem a relação entre o sujeito e seu mundo.
Por Paulo Cunha.
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